Além das chuvas, PEC que impede mudança do hino marca o 20 de setembro no RS
Em meio a desastre natural que atingiu o RS recentemente, hino do Estado é alvo debate acirrado no parlamento gaúcho.
A cada 20 de setembro, chuvoso ou não, os gaúchos festejam aquela que ficou conhecida como Guerra Farroupilha (1835-1845), quando parte da população da então província de Rio Grande de São Pedro pegou em armas para lutar contra o autoritarismo, o centralismo excessivo e a política tributária do governo brasileiro. Os elevados impostos cobrados pelo Rio de Janeiro, então capital, prejudicavam a pecuária do charque, principal iguaria produzida pelo Rio Grande do Sul na época.
A cada Semana Farroupilha, as polêmicas ressurgem acaloradas como a água do chimarrão. Para alguns, o episódio foi uma revolução, pois os farrapos lutaram por dez anos contra o Império brasileiro, separaram parte da província e ainda proclamaram a República Rio-Grandense. Por outro lado, para outros a Farroupilha não passou de uma revolta realizada pela elite escravista criadora de gado da Campanha gaúcha, a qual não possuía nenhum ideal abolicionista. Este argumento é reforçado pelo episódio do massacre dos Porongos de 1844, em que o batalhão dos lanceiros negros foi aniquilado por tropas imperiais com a conivência de líderes farrapos. A contenda terminou em 1845 com o Acordo de Poncho Verde, segundo o qual os comandantes farrapos foram incorporados ao Exército brasileiro, mas a escravidão foi mantida.
Trecho do hino gera divergências no parlamento estadual e municipal
Por causa deste histórico, um trecho do hino do Rio Grande do Sul causa polêmica ao mencionar que “Povo que não tem virtude acaba por ser escravo”. Os movimentos negros gaúchos questionam o caráter escravista da letra, que foi composta durante a guerra. Os movimentos tradicionalistas, por sua vez, explicam que o termo “escravo” não se refere ao sujeito escravizado, mas sim à condição de subalternidade a que a província poderia ter sido submetida caso continuasse aceitando as imposições do governo central.
As divergências a respeito do evento histórico repercutem nas polêmicas sobre os símbolos do estado sulista, uma vez que eles foram elaborados durante o conflito, como a bandeira, o brasão e o hino. As discordâncias deixam os ânimos aflorados nas terras pampeadas devido ao poder que possuem os símbolos, pois eles representam algo abstrato que pode despertar sentimentos de apego, identificação e pertencimento.
As polêmicas surgiram com força quando vereadores se recusaram a cantar o hino ao assumirem cargos na Câmara Municipal em 2021. Para alguns parlamentares, tal atitude foi vista como um desrespeito a um dos símbolos do Estado. Do Legislativo Municipal, a questão chegou ao Estadual, onde deputados divergem a respeito da temática e alguns se recusam a cantar o hino. Importante agregar que a temática ressurgiu com mais força com o surgimento da primeira “bancada negra” na Assembleia Legislativa gaúcha.
Como forma de garantir que o hino do estado não venha a ser alterado, o deputado estadual Rodrigo Lorenzoni (PL) encaminhou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 295/2023 na Assembleia Legislativa. Ela “institui proteção e imutabilidade” dos símbolos do Rio Grande do Sul (hino, bandeira e brasão). Os parlamentares também aprovaram a proposta que prevê que qualquer tentativa de alteração nos símbolos oficiais precisa passar, primeiro, por um referendo. De autoria do deputado Luiz Marenco (PDT), o projeto recebeu 39 votos favoráveis e 13 contrários. Após a aprovação, a PEC precisa ser assinada pelo governador Eduardo Leite. O chefe do Executivo, no entanto, tem evitado manifestar sua posição a respeito e concentrado esforços nas ações de reconstrução das cidades atingidas por enchentes no Estado.
Deputados contrários à proposta a consideram inconstitucional e argumentam que, conforme o artigo 6º da Constituição Estadual, as “Leis são discutidas, os símbolos também podem se alterar conforme o entendimento e o debate do Parlamento”. Por sua vez, os defensores da PEC 295/2023 sustentam que submeter a decisão a um referendo seria um procedimento democrático, na medida em que a população teria poder de decisão.
Hino Rio-Grandense já sofreu alterações ao longo da história
Cabe salientar que o hino já passou por alterações no passado. Modificações foram feitas em 1838, 1933 e na década de 1960. A versão atual é de 1966, quando a canção foi oficializada como Hino Rio-Grandense.
Revolução ou revolta? Hino racista ou não? Mudar o hino ou mantê-lo? As polêmicas continuam dividindo o Estado como um Gre-Nal e continuarão suscitando novas temáticas conforme a sociedade sul-riograndense se defrontar com novas problemáticas. Apesar das divergências, é provável que os gaúchos concordem com Osvaldo Aranha, que teria dito que não se pode escrever a história do Brasil sem mergulhar a tinta da caneta no sangue derramado no Rio Grande do Sul.
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